O espantalho faz o seu trabalho: espanta o corvo, que é um estorvo. O corvo põe um ovo, monta uma tenda e abre uma fenda para um mundo novo. Mas vai haver molho… por causa do olho. O corvo Vicente, o espantalho inocente, o olho dormente, adeus ao passado, saiam da frente, que agora é a gente quem faz o presente!
Um espectáculo de teatro e música que faz perder o medo das alturas e das altezas.
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“DO CÓMICO AO CÓSMICO” – Ana Lúcia Figueiredo
O Corvo e o Espantalho são as personagens graves, mas divertidas, que nos contam a história numa metáfora aparentemente simples e indiscutivelmente criativa sobre o mundo e a humanidade. Por isso, quando penso neste “Espanto”, ocorre-me de imediato o título “Do Cómico ao Cósmico”, de um poema de Luiza Neto Jorge.
Poderíamos chamar-lhe Manifesto de Liberdade, uma vez que coloca o ‘medo’ e a ‘regra’ como instrumentos de controlo da figura simbólica O Olho, ‘ sempre aberto, para ver se tudo está certo’. E o Espantalho vive limitado, no espaço (‘Fora do campo!’) e no tempo ( ́Faço o meu trabalho’), até ser provocado pelo Corvo, personagem construída a partir do conto “Vicente”, do livro Bichos, de Miguel Torga. A coragem, a rebeldia e a autonomia do pássaro, com música muitas vezes acompanhada por palmas do público, revelam uma narrativa política com uma lucidez clownesca. Poderíamos chamar-lhe também Elogio da Voz: ‘Calado é que eu não fico/ aqui não me sinto em casa/vou abrir a minha asa/ e sair da embarcação’. Quando assim canta o Corvo, faz ‘eco’ no Espantalho e no espectador, anunciando a subversão da mudança, mas não sem alguma resistência, com direito a luta de espadachim, durante um excerto de diálogo em francês do livro Le Petit Homme et Dieu, de Kitty Crowther. “Eu percebi omelette”, ouve-se na plateia. Ou não fossem os ovos uma presença em metamorfose constante, como o exercício filosófico de questionamento: ‘O que é que veio primeiro: o ovo… ou o corvo?’.
Poderíamos chamar-lhe ainda Breve Tratado do Espanto, no sentido em que relata a descoberta extraordinária da aventura, do perigo e da amizade, ao mesmo tempo que o cenário se vai desconstruindo, para dar origem ao desconhecido, ao inesperado, ao novo.
Poderíamos chamar-lhe muitas coisas, mas “Espanto” é quanto basta para sairmos da sala de espectáculos com um sorriso, que canta e dança e rima e ri… Este “Espanto” é de esperança e perseverança. E, quando termina, (re)começa em cada um de nós.
Como diz José Tolentino Mendonça: “O espanto obriga-nos a uma revisão do que sabemos de nós próprios e do mundo. Obriga-nos a recomeçar, como se fosse um nascer. O amor, o conhecimento, a poesia ou a santidade principiam com ele” (in O pequeno caminho das grandes perguntas).
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5 outubro 2024 – Festival Internacional de Teatro Cómico da Maia (Fórum da Maia)
30 junho 2024 -Festival Trip, Viseu
30 março 2024 – Teatro da Cerca de São Bernardo, Coimbra
11-12 janeiro 2024 – MAPO – Mostra de Artes Performativas de Odemira
5-6 outubro 2023 – Teatro Viriato, Viseu
17 setembro 2023 – Corpo de Hoje — Festival de Artes Performativas, Loulé e Tavira
10 setembro 2023 – Cultura em Expansão — Bairro Pinheiro Torres, Porto
3 junho 2023 – DesnorteArte — Arcozelo
14 maio 2023 – BioBlitz — Fundação Serralves, Porto
4 março-30 abril 2023 – Comédias do Minho — Valença, Monção, Melgaço, V. N. Cerveira, P. de Coura
15-25 fevereiro 2023 – CIAJG, Guimarães
8-10 maio 2022 – Teatro Aveirense (estreia)
3-7 maio 2022 – Fundação Lapa do Lobo (ante-estreia)